Acompanhem a continuação do artigo “Tendências em Hotelaria Hospitalar” publicado pela Revista HOSP:

HOSP_tendencias em hhTendências em Hotelaria Hospitalar Parte 2: O Resgate

Autora: Ana Augusta Blumer Salotti

No último artigo, falamos sobre duas grandes tendências no contexto da saúde que têm contribuído de maneira significativa para mudar a realidade hospitalar, bem como determinar outras tendências em hotelaria hospitalar como consequência.

Discorremos sobre a importância da qualidade para assegurar a segurança no cuidado, bem como otimizar recursos, além de atribuir maior credibilidade às instituições de saúde.

Atrelada à qualidade e ao planejamento estratégico das organizações, a hotelaria hospitalar tem também se consolidado como tendência irreversível, tendo como objetivo cuidar das áreas de apoio para que a equipe clínica possa se preocupar em cuidar exclusivamente da assistência.

A terceira grande tendência está intimamente relacionada à hotelaria hospitalar difundida enquanto cultura organizacional e à qualidade e à cultura de melhoria contínua.

Quando cito “hotelaria hospitalar difundida enquanto cultura organizacional”, estou me referindo à implantação dos conceitos de cordialidade, gentileza e hospitalidade, essência da hotelaria convencional, no dia a dia das instituições, ou seja, de dentro para fora: no respeito entre as áreas interdependentes, na cooperação entre as equipes multidisciplinares, no relacionamento de parceria entre as hierarquias e pares independentemente da área de atuação ou tipo de contrato. Desnecessário ressaltar que esse comportamento reflete no cuidado e tratamento com os pacientes, acompanhantes e familiares.

Sendo pessoa jurídica ou física, celetista, temporário, terceirizado ou estagiário, na hotelaria tradicional de excelência, o objetivo de agradar, surpreender, encantar e satisfazer aos hóspedes é tão bem difundido que todos unem seus esforços para esse único objetivo. Para que essa base seja bem estabelecida, uma rede multinacional de Hotéis que está em mais de 64 países, nos dá um exemplo. Seus colaboradores são vistos e tratados como associados e o maior lema da instituição é traduzido pela frase “cuide bem dos seus associados e eles cuidarão bem dos seus hóspedes”.

E esse é exatamente o ponto chave da implantação da tendência que estamos abordando: o cuidado com foco no paciente.

O conceito de cuidado com foco no paciente, segundo o Institute of Medicine, é o cuidado em saúde que estabelece uma parceria entre profissionais, pacientes e familiares (quando apropriado) para garantir que as decisões respeitem as vontades, necessidades e preferências e que os pacientes tenham a educação e apoio requeridos para tomar decisões e participarem em seu próprio tratamento.

De acordo com Charmel e Frampton, o cuidado com foco no paciente pode ser definido como um cenário de assistência em saúde no qual os pacientes são encorajados a ter autonomia por meio de envolvimento ativo em seu tratamento; ocorre em um espaço físico agradável e disponibiliza uma equipe dedicada a ir de encontro às necessidades físicas, emocionais e espirituais dos mesmos. Os requisitos necessários para caracterização de um modelo centrado no paciente podem incluir:

• Uma cultura organizacional que encoraja a equipe a ser sensível às necessidades do paciente durante sua estada no hospital;

• Um design arquitetônico e interior que dê um toque caseiro e encoraje a mobilidade do paciente, envolvimento da família no processo e espaço tanto para solidão quanto atividades sociais;

• Ênfase em educação, instrução do paciente e familiares;

• Reconhecimento da nutrição como parte integral da saúde bem como uma fonte de prazer, conforto e familiaridade;

• Apoio ao envolvimento de membros da família no processo de tratamento, cuidado e assistência.

O cuidado com foco no paciente atenta para o resgate da importância das pessoas como parte integrante no cuidado, e esse conceito não se limita a aos pacientes, mas abrange todos envolvidos no processo.

Assim como nos encoraja a enxergar os pacientes de forma holística, para que esse conceito seja efetivamente implementado, é necessário ter uma visão sistêmica não apenas de revisão de processos pela perspectiva dos pacientes, mas principalmente, da cultura organizacional, que incide diretamente na gestão das pessoas que são responsáveis pela entrega dessa experiência em cuidado.

Como conseguir estabelecer padrões de qualidade, garantir segurança, implantar ações de hotelaria hospitalar e praticar o cuidado com foco no paciente quando dependemos de pessoas que estão sempre em rotatividade? Ou estão sempre esgotadas, insatisfeitas, apáticas ou até insubordinadas?

Frente à um cenário de grande concorrência por profissionais qualificados, escassez de mão de obra, altos índices de absenteísmo e turnover, conseguir fidelizar clientes internos e criar com eles um time de aliados tem se tornado tão importante quanto conquistar e fidelizar clientes externos.

E o cuidado com foco no paciente exerce uma grande influência na satisfação interna como consequência. Além de ser um conceito que nos ajuda a traduzir a humanização para ações concretas e práticas, o cuidado com foco no paciente ajuda a mudar a perspectiva pela qual os profissionais da saúde enxergam sua importância, seu papel, criando maior sentido e auto realização na atividade desempenhada.

Estivemos em Setembro em Belo Horizonte e São Paulo, em dois eventos relacionados à área de hotelaria hospitalar, discutindo sobre gestão estratégica de pessoas e sobre a ferramenta online como inovação em treinamento.

Levei resultados de pesquisas alinhadas ao cuidado com foco no paciente, que nos ajudam a reavaliar nossa gestão e nortear novas ações.

Uma das mais importantes, segundo minha opinião, é relatada em um artigo intitulado “Inovação e Liberdade”, que explora a experiência do professor da escola suíça de negócios IMD, Bill Fischer. O autor narra a análise de dados estratificados de trabalhos desenvolvidos na China, Japão, Alemanha e Escandinávia sobre a relação entre a capacidade de inovar de uma empresa e sua competência para gerir talentos.
A conclusão relatada ao analisar os estudos de Bill Fischer é: ao mesmo tempo em que as empresas conseguem atrair e selecionar os melhores talentos, aproveitam apenas 50% do potencial dos mesmos.

Para o autor, a gestão eficaz, baseada em relações pessoais, pode ser a razão do aproveitamento um pouco melhor, notificado por 23% das empresas brasileiras submetidas à mesma pesquisa e que conseguem explorar até 60% da capacidade de seus talentos.

Sem considerar gastos implícitos em recrutamento e seleção, o autor leva os leitores à uma profunda reflexão quanto ao investimento e desperdício de recursos, finalizando: “O dilema é: as empresas recrutam e selecionam os melhores profissionais, mas depois os transformam em profissionais medianos. Imagine o quanto isso custa em termos de investimento em treinamento e o quanto é desmotivador!”

Quando fazemos um paralelo entre os conceitos de cuidado com foco no paciente e a Política Nacional de Humanização (PNH), conseguimos identificar um alinhamento de princípios e diretrizes.

Reforçando a importância das pessoas para o sucesso da implantação da PNH, Cleusa Pavan discorreu sobre o principal investimento para implantação da política, relatando a importância de uma gestão segura, aberta e inovadora para que as mudanças não sejam vistas como ameaças e muito menos perda de poder ou autoridade.

Os maiores investimentos, portanto, são em esforços, em mobilização e envolvimento de pessoal, em sensibilização: em disseminar e estabelecer um ideal, um novo princípio, que depende de mudanças de pensamento e comportamento para concretização.

Apesar de ser um conceito que exige grande esforço para implementação, o cuidado com foco no paciente tem resultados comprovados de seus benefícios.

Entre eles estão:

• Redução do tempo de internação;
• Diminuição do custo por paciente;
• Diminuição da incidência de eventos adversos;
• Redução dos custos de operações;
• Declínio de queixas de maus tratos;
• Aumento de participação no mercado;
• Aumento dos índices de satisfação internos (colaboradores);
• Maiores taxas de retenção de colaboradores;
• Redução do tempo de recuperação;
• Redução na quantidade de administração de medicamentos para controle de dor;
• Aumento do índice de pacientes que definitivamente recomendariam o hospital para outros;
• Aumento dos índices de satisfação dos pacientes.

Relacionando esse conceito à uma das primeiras afirmações que fizemos no início do artigo, a implantação do cuidado com foco no paciente requer mudanças culturais, que envolvem desde a revisão e reestruturação de processos relacionados à cultura de melhoria contínua (qualidade e segurança) até implantação da hospitalidade, cordialidade e espírito de servir, conforme a hotelaria tradicional prega.

Essas, segundo minha opinião pessoal com base nos dados demonstrados, são as três grandes tendências na área da saúde atualmente.

Fonte: Revista HOSP  Edição Setembro de 2014

 

Ana Augusta Blumer Salotti

Idealizadora, criadora e principal colunista do site HotelariaHospitalar.Com.

Especialista em reestruturação da área de hotelaria nos hospitais com foco em certificação de qualidade e humanização, sendo palestrante em eventos nacionais e internacionais.

Sócia fundadora da empresa Hotelaria Hospitalar Comunicação e Treinamentos, possui MBA em Gestão em Saúde, Pós Graduação em Hotelaria Hospitalar e Graduação em Hotelaria.

Autora do trabalho “Análise das Contribuições do Modelo Planetree para a Prática de Hotelaria Hospitalar”.

Referências:

CABRERA, Luiz Carlos. Inovação e Liberdade São Paulo, revista Você S/A, Abril, Setembro 2010
CHARMEL, Patrick e FRAMPTON, Susan. Building the Business Case for Patient-Centered Care Illinois, revista Healthcare Financial Management, 2008
FRAMPTON, Susan e CHARMEL, Patrick. Putting Patients First, Best Practices in Patient Centered Care Planetree San Francisco (EUA), Jossey Bass 2009 (second edition)
INSTITUTE OF MEDICINE. Crossing The Quality Chasm, A New Health System for the 21st Century Committee on Quality of Health Care in America, National Academy Press, Washington, D.C.
PAVAN, Cleusa. Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do SUS São Paulo, Palestra ministrada em 18 de Março de 2011 no Hospital Emílio Ribas
*Salotti, Ana Augusta Blumer. Humanização, Hotelaria Hospitalar e Qualidade, em uma Análise do Modelo Planetree para a Prática de Hotelaria Hospitalar São Paulo, 2014 (em fase de publicação)

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